30/09/2007

Parecia Natal...


Chovia. E foi com essas gotas ácidas a pousarem brutalmente sobre o solo, lá fora, que acordei. Não sei bem porquê, mas instalou-se no meu pensamento a manhã de dia 25 de Dezembro.

Quis virar-me para o lado esquerdo e ver a minha avó na outra cama do quarto, com o terço nas mãos. Quis levantar-me da cama para colocar sobre o corpo aquele robe rosa, meu companheiro de muitos anos, e dirigir-me à cozinha, vendo a mesa ainda posta, com nódoas que marcaram a noite anterior, sentir aquela confortável escuridão. Quis caminhar pelo corredor unicamente iluminado pela janela das escadas e espreitar pela porta os meus pais ainda a dormir. Quis então entrar na sala e sentir as cinzas da lareira ainda mornas a aquecerem a divisão, observar a árvore enfeitada ressacada e o chão coberto de papéis, a mesinha recheada de presentes já desembrulhados e um suave olfacto a chocolate de leite a despertar as minhas narinas.

O melhor de tudo é o almoço. Uma larga mesa abastada de tudo o que gosto. Trincar o peru estaladiço, mastigar as batatinhas queimadas em cima, partir com o garfo o arroz no forno com rodelinhas de chouriça. E também o salgado dos camarões. E sobremesas!, aquelas colheradas de prazer!

Volto à realidade. Ergo-me e não existe avó alguma no quarto, a cozinha está bem iluminada pelos raios de sol matinais, o quarto dos meus progenitores encontra-se vazio, e a sala nem parece a mesma daqueles dias de azáfama.

Está limpíssima, ampla, clara. Qual árvore de Natal, apenas um candeeiro que jamais foi utilizado! As cinzas estão geladas, e cheiros, um perfume enjoativo dá o toque final.

Concluo que só naquele dia é que estamos todos juntos, só naquele dia é que nos ouvimos uns aos outros, só naquele dia é que nos compreendemos. Agora a sala não me traz nada de familiar. Falta-lhe sentimentos, calor, alegria, tristeza. Sinto-me nostálgica. Somente no dia 25 a sala se torna numa família.

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